CRISE NA CBF,
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A CBF – Confederação Brasileira de Futebol enfrenta mais um capítulo turbulento em sua já conturbada gestão. O centro da nova crise gira em torno da autenticidade da assinatura de Antônio Carlos Nunes, o Coronel Nunes, em um acordo que foi fundamental para garantir a permanência de Ednaldo Rodrigues na presidência da entidade.
Entenda o caso
Em fevereiro de 2025, o STF homologou um acordo firmado entre a CBF, a Federação Mineira de Futebol e dirigentes da entidade, reconhecendo a legalidade da eleição de Ednaldo Rodrigues, realizada em março de 2022. A decisão pôs fim a disputas judiciais e assegurou a continuidade do mandato de Ednaldo até 2026.
No entanto, o ex-vice-presidente da CBF, Fernando Sarney – um dos signatários do acordo – solicitou ao STF a anulação do documento, alegando que Coronel Nunes não teria condições cognitivas e psicológicas para firmá-lo. A acusação é respaldada por um laudo médico do chefe do departamento médico da CBF, Jorge Pagura, além de um parecer técnico independente que concluiu pela “não identificação do punho periciado de Antônio Carlos Nunes de Lima”, levantando suspeitas de falsificação.
Diante das denúncias, o ministro Gilmar Mendes, relator do caso no STF, rejeitou, em 7 de maio, os pedidos de afastamento imediato de Ednaldo Rodrigues, contudo, determinou ao TJ/RJ a apuração imediata das alegações, incluindo a possível falsificação da assinatura, no âmbito da ação civil pública que originou o acordo.
Audiência marcada
Atendendo à determinação do STF, o relator do caso no TJ/RJ, desembargador Gabriel de Oliveira Zefiro, designou uma audiência para o dia 12 de maio, às 14h, com o objetivo de ouvir pessoalmente Coronel Nunes. O ato será realizado por videoconferência, considerando o delicado estado de saúde do ex-dirigente, diagnosticado com neoplasia cerebral maligna e cardiopatia grave.
Se confirmadas as suspeitas de falsificação, o caso pode desencadear uma reviravolta sem precedentes na cúpula do futebol brasileiro. A depender do resultado da audiência, o acordo pode ser anulado e levar ao afastamento imediato de Ednaldo Rodrigues da presidência da CBF, além de gerar vários desdobramentos jurídicos.
Dúvida sobre assinatura de Coronel Nunes em acordo da CBF pode ter vários desdobramentos jurídicos.(Imagem: Fotoarena/Folhapress)
Desdobramentos
Um desdobramento possível do caso é no campo da CEFB – Comissão de Ética do Futebol Brasileiro, que foi acionada pela deputada Daniela Carneiro (União-RJ) para apurar se a situação envolvendo a assinatura do Coronel Nunes configura infração ao Código de Ética e Conduta do Futebol Brasileiro.
A questão é relevante e pode ter implicações concretas. Foi a CEFB que afastou cautelarmente Rogério Caboclo, então presidente da CBF, do cargo em 2021, após abertura de processo para investigar denúncias de assédio moral e sexual. Depois da cautelar que o tirou da presidência, Caboclo nunca mais voltou ao cargo, tendo sido condenado ao final do processo a um afastamento total de 41 meses do futebol. Na ocasião, a FIFA determinou que o afastamento do dirigente tinha validade mundial.
Segundo Paulo Schmitt, ex-Procurador-Geral da Justiça Desportiva, caso as suspeitas envolvendo a assinatura do Coronel Nunes em um acordo judicial sejam confirmadas pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, será inevitável a apreciação do caso pela CEFB – Comissão de Ética do Futebol Brasileiro:
“Se restar comprovado que houve falsificação ou fraude em um documento protocolado junto ao Supremo Tribunal Federal, trata-se de um fato de extrema gravidade, que compromete não apenas a transparência da entidade, mas a própria confiança no sistema esportivo. Nessa hipótese, a atuação da Comissão de Ética será imprescindível. É dever institucional apurar com rigor, respeitando integralmente o contraditório e o direito de defesa de todos os envolvidos.”
Schmitt lembra que, conforme o Código de Ética do Futebol Brasileiro, a CEFB dispõe de amplo espectro sancionatório, que inclui advertência, multa, suspensão, destituição e até banimento do futebol, a depender da gravidade e da autoria das condutas eventualmente confirmadas.
Outro possível desdobramento do caso pode se dar no campo do Direito Penal. Para Adriano Teixeira Guimarães, doutor em Direito Penal e professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, a depender do que for revelado na apuração do caso pelo TJ/RJ, pode haver em tese diferentes enquadramentos penais para a situação. O primeiro é o crime de falsidade ideológica, previsto no art. 299 do Código Penal e com pena de um a cinco anos, que pune aquele que omitir ou inserir informações falsas em documentos a fim de prejudicar direito ou alterar a verdade sobre um fato juridicamente relevante. O segundo é o crime de fraude processual, previsto no art. 347 do Código Penal, que consiste em modificar de forma artificial a realidade dos fatos para induzir o juiz a erro. Outra possibilidade seria o crime de corrupção privada no esporte, previsto no art. 165 da Lei Geral do Esporte, que pune aqueles que solicitam ou recebem vantagens indevidas, enquanto representantes de organizações esportivas, para favorecer a si ou a terceiros; nesse caso teria de ser provado que o representante da organização esportiva solicitou ou recebeu alguma vantagem indevida a fim de realizar ou de omitir ato inerente às suas atribuições
Todos esses cenários são no momento apenas possibilidades, que podem ou não se concretizar a depender do que acontecer na audiência marcada para ouvir o Coronel Nunes, no dia 12 de maio, às 14 horas. Dado o histórico recente da CBF, que teve os seus últimos quatro presidentes (Ricardo Teixeira, José Maria Marin e Marco Polo del Nero e Rogério Caboclo) afastados, banidos ou mesmo presos, uma coisa parece certa: ainda haverá muitos desdobramentos jurídicos da mais recente crise do futebol brasileiro.
Com informações do www.migalhas.com.br