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Acirramento da tensão com o governo sandinista ocorre no momento em que Itamaraty tenta se posicionar como mediador diante de questão eleitoral venezuelana

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu nesta quinta-feira (8) expulsar a embaixadora da Nicarágua, Fulvia Patricia Castro Matu. A decisão foi uma resposta à ordem da ditadura de Daniel Ortega de mandar embora do país o embaixador brasileiro em Manágua, Breno Souza da Costa. A expulsão da embaixadora da Nicarágua foi anunciada após reunião entre Lula e o chanceler, Mauro Vieira. Fulvia Matu recebeu a aceitação do Itamaraty em 22 de maio, mas não chegou a ser recebida pelo presidente brasileiro. Ela ainda estava na fila quando a crise começou. Por enquanto, não há planos de rompimento de relações diplomáticas.

A ordem de Ortega para expulsar o embaixador brasileiro, que se tornou pública ontem (8), foi uma retaliação pela ausência de Souza da Costa na celebração dos 45 anos da Revolução Sandinista. Ao ser notificado sobre a queixa, o governo brasileiro chegou a pedir à Nicarágua que ponderasse, mas ficou sem resposta. O gesto de expulsar embaixadores, algo grave na diplomacia, marca o distanciamento entre Lula e Ortega. O presidente brasileiro tem uma relação de longa data com Ortega, mas tensionada pela perseguição a líderes católicos na Nicarágua.

Dois momentos foram cruciais para desgastar a amizade: a expulsão de opositores nicaraguenses que o Brasil se ofereceu para abrigar, após os protestos de 2018, e a prisão do bispo Rolando Álvarez, condenado a 16 anos por se recusar a deixar o país — ele cumpre pena em regime domiciliar. Lula disse há pouco mais de duas semanas que Ortega não atende às suas ligações desde que ele se propôs a interceder pela liberação do bispo, a pedido do papa Francisco. O acirramento da tensão com a Nicarágua ocorre no momento em que o Brasil tenta se posicionar como mediador diante de outro regime autoritário de esquerda, o de Nicolás Maduro, na Venezuela. As duas crises têm relação entre si, já que Ortega é aliado de primeira hora do chavismo — a Nicarágua foi um dos primeiros países a reconhecer a vitória de Maduro na eleição do dia 28.

“É preciso analisar essa situação muito em paralelo com o que está acontecendo na Venezuela”, afirma Daniel Buarque, doutor em relações internacionais e editor executivo do portal Interesse Nacional. Segundo ele, o eventual rompimento das relações da Nicarágua com o Brasil e a tensão que se segue após a reeleição fraudulenta de Maduro evidenciam a radicalização desses dois regimes — o que representa um desafio, mas também uma oportunidade para o governo brasileiro. “É uma chance de Lula adotar uma posição menos leniente com esses governos autoritários de esquerda, de demonstrar que vai defender a democracia e não pretende aceitar governos autoritários apenas por questões ideológicas”, afirma Buarque.

Ao mesmo tempo, segundo ele, as relações com esses países são importantes para o Brasil se posicionar como líder na América Latina, como almeja o presidente Lula. “Fica mais difícil propor saídas para o autoritarismo agora que esses países estão mais hostis à presença do Brasil, mas esse é um desafio que o país tem de enfrentar sem ser leniente.” “Não adianta querer ser um líder global que respeita a soberania dos países e abraçar ditador como se estivesse tudo bem, porque não está”, continua. “É a oportunidade de ter uma relação mais formal, que consiga pressionar esses países sem partir da simpatia ideológica”.

*Com informações do Estadão Conteúdo