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Países suspenderam pagamentos após as acusações israelenses de que alguns de seus funcionários teriam participado dos ataques de 7 de outubro; enclave palestino é altamente dependente do organismo

A Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA, na sigla em inglês) anunciou, nesta quinta-feira, que pode ser forçada a encerrar suas operações “até o final de fevereiro”, após 16 países terem suspendido suas doações, na esteira das acusações israelenses de que seus funcionários estiveram envolvidos no ataque do Hamas em 7 de outubro.

“Se os financiamentos continuarem suspensos, muito provavelmente teremos que cessar as nossas operações no final de fevereiro, não apenas em Gaza, mas em toda a região”, alertou o chefe da agência, Philippe Lazzarini, em um comunicado. A agência também está presente na Cisjordânia, no Líbano, na Síria e na Jordânia.

Vários países doadores anunciaram a suspensão ou congelamento de seu financiamento após Israel ter afirmado que 12 funcionários da agência participaram do ataque do Hamas no sul do país, em outubro passado, que deixou 1,2 mil pessoas mortas e outras 250 foram levadas como reféns para Gaza, segundo as autoridades israelenses.

São eles: Estados Unidos, Austrália, Reino Unido, Canadá, Itália, Holanda, Alemanha, Finlândia, França, Japão, Romênia, Estônia, Islândia, Suécia e Áustria. A União Europeia afirmou que não está previsto “nenhum financiamento adicional para a UNRWA até o final de fevereiro” e pediu uma auditoria na agência, e a Suíça anunciou que só realizará os pagamentos que ainda não foram feitos e estão planejados para este ano quando tivesse mais informações sobre as acusações.

A alegação israelense levou o organismo a demitir nove funcionários. Um dos supostos envolvidos foi confirmado morto, e outros dois ainda passam pela identificação do nome, segundo a ONU. Um dossiê fornecido ao governo americano, revisado pelo The New York Times e o Wall Street Journal, afirma que os oficiais de inteligência israelense identificaram os envolvidos pelo rastreamento de seus celulares.

Ainda de acordo com informações repassadas por militares do Estado judeu, 10% dos 13 mil funcionários da agência em Gaza (1,3 mil pessoas) seriam membros do Hamas. Israel alega que chegou ao número por meio do cruzamento de uma lista de funcionários da UNRWA com um diretório de membros do grupo que os soldados encontraram em um computador durante uma operação recente dentro de Gaza.
‘Espinha dorsal’

A UNRWA fornece há décadas uma série de serviços sociais à população de Gaza — altamente dependente de ajuda humanitária de organizações internacionais — construindo e operando escolas, abrigos e clínicas médicas, gerando empregos, e através da distribuição de água, alimentos e medicamentos.

A procura e a dependência dos seus serviços aumentaram acentuadamente desde o início da guerra entre Israel e Hamas, depois que o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu declarou um “cerco total” ao enclave em retaliação aos ataques de 7 de outubro.

Devido ao conflito, ao menos 26,9 mil pessoas morreram, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, e a maior parte dos 2,2 milhões de habitantes de Gaza foram deslocados de suas casas. Cerca de 1,7 milhões estão abrigados em centros e escolas geridos pela agência, que ajuda a distribuir a ajuda que chega à região todos os dias.

Relação conturbada

Israel acusa a UNRWA de estar “totalmente infiltrada pelo Hamas” — afirmação rejeitada pela agência. O país há muito questiona a sua atuação exclusiva aos palestinos (e não a da agência geral para o tema, o ACNUR), classificando seus métodos como antiquados, sobretudo o fato de oferecer o status de refugiado a todos os palestinos, mesmo os que não estão instalados em campos de refugiados — algo que o governo israelense diz prolongar a guerra de independência de 1948 e legitimar o chamado “direito ao retorno” por gerações

Após o anúncio das demissões e a suspensão do financiamento em massa dos países, o Estado judeu apelou à agência humanitária que interrompa o seu trabalho após o término da guerra. Na terça-feira, o porta-voz do governo, Eylon Levy, disse que a UNRWA “foi fundamentalmente comprometida”, acusando a agência de “contratar terroristas em grande escala, deixar a sua infraestrutura ser usada para atividades militares do Hamas e depender do Hamas para a distribuição de ajuda na Faixa de Gaza”.

De acordo com o dossiê fornecido às autoridades americanas, entre os apontados como envolvidos, sete seriam professores em escolas administradas pela agência, dois seriam funcionários das instituições de ensino, mas em outras funções, um seria balconista, outro assistente social e o último chefe de almoxarifado.

Um dia depois, o premier israelense afirmou, em uma reunião de embaixadores na ONU, que a UNRWA foi “totalmente infiltrada” pelo Hamas. Ele instou, ainda, recorrer a “outras agências da ONU e outras organizações humanitárias” para substituir a UNRWA. A afirmação já havia sido compartilhada pelo ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, ao afirmar que procuraria apoio para o objetivo da União Europeia, dos Estados Unidos e de outros países. (Com AFP)