Foto: Reprodução/Internet
Por Valter Nogueira
A polêmica em torno do afundamento do porta-aviões São Paulo, ocorrido na última sexta-feira (3), ainda vai dar muito o que falar. A solução encontrada para o navio de combate, carregado de amianto e outros materiais tóxicos, causou reação de ambientalistas, com repercussão internacional.
É aceitável o argumento do juízo do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no Recife, que, na decisão autorizativa da ação da Marinha, argumenta que evitar a operação seria “provavelmente inútil”, dada a “iminência de um afundamento espontâneo do casco”.
Devido às graves avarias, a Marinha do Brasil argumenta, também, que um reparo seria um tanto quanto oneroso.
Todavia, o fato é que o afundamento gerou um sem número de especulações negativas.
Ainda, claro, faltam informações detalhadas da ação, mas é possível que itens, tais como motor, equipamentos eletrônicos e mecânicos, entre outros, devem ser removidos de um navio antes de uma ação que culmina em afundar uma embarcação de tal porte.
Mas, sem dúvidas, a questão ambiental é de longe o ingrediente que deve incendiar as discussões futuras em torno do atual fato.
Protestos não faltam, ONGs preveem “danos incalculáveis” para meio ambiente.
A realidade é que, após décadas de serviço à Marinha francesa e brasileira, e desativado desde 2018, o porta-aviões São Paulo, enfim, repousa no leito do Oceano Atlântico, no litoral do Nordeste brasileiro. Tachado de “pacote tóxico de 30 mil toneladas”, o porta aviões teve submersão controlada a 350 km da costa brasileira, após meses de impasse.
No que pese protestos de diversas organizações ambientais, a Marinha do Brasil anunciou ter afundado no Oceano Atlântico, no fim da tarde da última sexta-feira (3), o antigo porta-aviões São Paulo. Com ele, foi afundado também amianto, tintas contendo microplásticos e outros resíduos tóxicos.
O “afundamento planejado e controlado”, iniciado com três furos no casco, transcorreu a cerca de 350 quilómetros da costa brasileira, a “aproximadamente 5 mil metros de profundidade”, informou a Marinha em comunicado.
A Marinha, em declaração conjunta com o Ministério da Defesa, informou, na quarta-feira (1), que não havia alternativa senão remover o casco de 266 metros de comprimento. “Tendo em conta os riscos envolvidos no reboque e a deterioração (…) a única solução é abandonar o casco, afundando-o de forma controlada”, explicou a nota conjunta.
Ministério Público
O Ministério Público tentou sustar a operação por meio de uma série de processos judiciais, alertou para as consequências, salientando que o porta-aviões “contém 9,6 toneladas de amianto, uma substância com potencial tóxico e cancerígeno, bem como 644 toneladas de tintas e outros materiais perigosos”.
Existe um “risco de danos ambientais graves (…) em particular porque o casco está danificado”, argumentou o órgão.
Turquia
Vale ressaltar que o porta-aviões havia sido comprado por estaleiro turco, para sucateamento. No entanto, a embarcação de combate teve que ser devolvida após ação contrária à compra naquele país.
O estaleiro turco Sök Denizcilik comprou a embarcação em abril de 2021, para sucateá-la, mas não conseguiu encontrar um porto para recebê-la. Assim, o Brasil recebeu o navio de volta, porém não permitiu que atracasse, devido aos danos no casco.
Perigo
As organizações ambientalistas não-governamentais, tais como Greenpeace, Sea Shepherd e Rede de Ação de Basileia se posicionaram contra o afundamento do navio, ao considerara a ação “uma violação de três tratados internacionais” sobre o meio ambiente.
Em declaração conjunta, ONGs afirmam que a submersão vai causar “danos incalculáveis”, com “impactos na vida marinha e nas comunidades costeiras”.
Decisão judicial
Juiz do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no Recife, argumentou que evitar a operação seria “provavelmente inútil”, dada a “iminência de um afundamento espontâneo do casco, que nada faria pelo ambiente e seria suscetível de pôr em perigo a vida da tripulação envolvida na operação de reboque”.
O magistrado autorizou o afundamento, embora considerando a solução “trágica e lamentável”. Enquanto se aguardava uma decisão judicial, o São Paulo ficou meses à deriva diante do litoral de Pernambuco.
Ibama
Um dia antes do acontecimento, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) divulgou uma nota em que projeta impactos ambientais que podem ser causados pelo afundamento do porta-aviões desativado, que até então estava vagando no mar após ser proibido de atracar no Brasil e no exterior.
Entre os possíveis danos ambientais listados pelo Ibama, estão:
– A liberação de materiais poluentes contidos na estrutura poderia causar distúrbio na capacidade filtrante e dificuldade de crescimento em organismos aquáticos;
– O impacto físico sobre o fundo do oceano provocaria a morte de espécies e deterioração de ecossistemas;
– Emissão de gases (CFCs e HCFCs) usados no isolamento de salas contribuiriam, a partir da corrosão das paredes, para a degradação da camada de ozônio;
– A carcaça poderia atrair espécies invasoras prejudiciais para a biodiversidade nativa;
– Microplásticos e metais pesados presentes em tintas da embarcação poderiam se tornar protagonistas de bioacumulação indesejável em organismos aquáticos.
Diante dos impactos estimados, o órgão ambiental pediu à Marinha informações que permitam aos técnicos avaliar alternativas para reduzir os danos ambientais, com reparação e salvaguarda do meio ambiente após o afundamento do navio.
Histórico
Construído em fins dos anos 1950 no estaleiro naval Saint-Nazaire, no oeste de França, o porta-aviões, o porta-aviões originalmente batizado Foch serviu a Marinha francesa durante 37 anos, antes de ser comprado em 2000 pelo Brasil, por US$ 12 milhões.
No entanto, devido à idade e a uma série de problemas, incluindo um incêndio em 2005, em 2018 o São Paulo foi desativado como embarcação de combate. Em ato contínuo, o governo federal decidiu desfazer-se dele. Na justificativa, há especulação de que uma reforma sairia demasiado caro.
Duas semanas atrás, a Marinha anunciou ter rebocado o velho porta-aviões para o Atlântico. Dado o estado de degradação e “o elevado risco”, que representava para o meio ambiente, reforçou que não autorizaria o regresso a um porto ou a águas costeiras brasileiras.