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Especialistas ouvidos pela Jovem Pan pontuam que mesmo que os dois países não sejam potências econômicas, eles representam 40% do mercado mundial e geraram um choque de oferta de commodities

Em seis meses de conflito entre Rússia e Ucrânia, esses dois países que representam apenas 2% do PIB do comércio mundial, segundo o OCDR, conseguiram fazer a economia mundial ir de recuperação para recessão. “Há seis meses, o quadro macroeconômico era muito diferente de hoje”, disse a agência de classificação S&P Global em nota. Na época, havia boas perspectivas de crescimento e a inflação era considerada “em boa parte transitória”. Entretanto, de acordo com o S&P Global “as coisas mudaram, e não foi para melhor”. Grandes organizações internacionais reduziram sistematicamente suas previsões de crescimento global para este ano.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) agora prevê um crescimento de 3,2%. Em outubro de 2021, a projeção era de 5%. Especialistas ouvidos pela Jovem Pan explicam como a Ucrânia e a Rússia conseguiram mudar drasticamente este cenário.

Segundo Daniel Miraglia, economista chefe da Integral Group, “o que a guerra trouxe foi um choque de oferta de commodities, principalmente as agrícolas”, porque “tanto a Rússia como a Ucrânia são produtoras de trigos e de fertilizantes” e isso gerou um choque de oferta e, em economia, você tem duas alternativas quando isso acontece. “O processo inflacionário que traz para baixo a oferta” e ocasiona o aumento dos preços. O economista Lucas Dezordi explica que a economia mundial já vinha crescendo com algumas restrições de produção de custo de alimentos e custo de energia. Ele ressalta que os dois países em conflito “não são grandes economias do ponto de vista de per capita, mas são importantes em setores que já estavam com restrição de oferta”. Isso por causa da pandemia de Covid-19, que já tinha deixados traços a serem reconstruídos.

O professor de economia da Unicamp Marco Antônio Rocha vai além e fala que apesar de os países não estarem entre as economias mais importantes e desenvolvidas do mundo, eles possuem participação no mercado mundial de 40%. Dessa forma, fica mais fácil entender como o mundo foi impactado economicamente pelo conflito que acontece no Leste Europeu. “O aumento do preço dos alimentos, sobretudos dos grãos, cria um processo inflacionário que reduz a renda disponível das famílias” e cria uma tensão social que vai afetando outros mercados. O professor cita o exemplo de recessão que já está acontecendo na Alemanha. “A economia alemã está desacelerando, e isso puxa a zona do euro para um quadro mais recessivo”.

Da Europa aos Estados Unidos, da América Latina à África, o cenário é o mesmo. Na Tunísia, “as classes trabalhadoras estão passando por uma catástrofe”, afirmou Naima Degaoui, uma enfermeira aposentada de 70 anos, em entrevista à agência de notícias AFP. “Os preços sobem em quase todos os lugares, é o pêssego, o damasco, a pimenta, cujo preço quadruplicou, a carne vermelha”, acrescentou. A 11.000 km de distância, em Valparaíso, no Chile, Nayib Piñeira, assistente social de 33 anos, disse que “tudo está mais caro”. Um litro de gasolina custa 1.300 pesos, “praticamente o que um cidadão europeu paga com um salário europeu”. A alta dos preços dos alimentos somada ao custo do transporte e de produtos como o trigo, os azeites e os fertilizantes, foi tamanha que a ONU alertou para o risco de um “furacão de fome” na África, embora os preços tenham baixado nas últimas semanas. Diante da inflação galopante, a política de ajuda maciça associada aos confinamentos durante a pandemia voltou à tona, apesar das dívidas públicas historicamente altas.

Subsídios ao aquecimento, descontos nos combustíveis, tetos de preços e impostos sobre os lucros das companhias petrolíferas… Os países europeus competem na imaginação, enquanto os Estados Unidos adotam sua “Lei de Redução da Inflação”, um plano de investimentos de US$ 370 bilhões. O apoio público tornou-se ainda mais essencial à medida que os bancos centrais endurecem a política monetária para reduzir a inflação.

Para Daniel Miraglia, a recessão mundial é algo que deve acontecer e vai ser forçado pelos bancos centrais para controlar o processo inflacionário. “O Fed vai vir com mais 0,75 na próxima reunião e vai continuar subindo os juros até o começo do ano que vem”, pontua. “O Banco Central europeu também já começou com alta e vai continuar subindo os juros até o primeiro trimestre do ano que vem”. Tudo isso como estratégia para conseguir controlar a atual situação, pois, “quando sobe o juros, desacelera a economia mundial”. Contudo, ele aponta que nesse momento o foco não é a recuperação economia e sim controlar a inflação. Para o economista Lucas Dezordi, uma forma de melhorar a situação econômica mundial é ter uma “diminuição nos conflitos e uma relação melhor da Rússia com o Ocidente”.

O professor Marco Antônio Rocha diz que todo esse cenário de incerteza “prejudica o investimento e reduz a taxa de crescimento da economia mundial”. Para ele, controlar essa situação é complicada e já vimos isso do ponto de vista internacional. “É difícil pensar em uma forma de conseguir controlar”, aponta. Ele pontua que o que estamos vendo ultimamente são soluções nacionais.

Quando se trata da maneira como os países conseguiram lidar com a situação, os especialistas discordam sobre o Brasil. Para Miraglia, o país está em um momento diferente, pois está “no fim do aperto monetário”. Com isso, a “inflação já está cedendo e estamos tendo deflação”. Para ele, o país está “adiantado no controle da inflação em relação ao resto do mundo”. Porém, alerta que se a recessão vier, seremos afetados da mesma maneira, pois é algo que atinge a todas. Já Dezordi e Marco Antônio falam que o país não soube lidar muito bem com essa situação. “O dado é simples, tirando a Rússia, que está em guerra, o Brasil é o pior em projeção de crescimento em todos os mercados emergentes”, diz o professor da Unicamp. “Não houve estratégia e nada foi feito”, acrescenta. O economista Dezordi concorda e diz que o país foi bem atingido, “principalmente em casos de alimentos e preços de energia”.

Com informações da Agencia Brasil