© DW Advogados durante processo do Affaire Climat em Bruxelas

Brenda Odimba entrou no Palácio da Justiça de Bruxelas nesta quinta-feira (25.mar.2021) com uma mensagem clara para seu governo: “Por favor, pare de negar sua inércia e comece a agir.”

A engenheira é uma dos mais de 60 mil cidadãos belgas que levaram as autoridades federais e regionais do país aos tribunais, acusando-as de falhas ilícitas na política climática. “Não estamos contentes com o que o governo está fazendo”, diz Odimba em entrevista à DW“Como cidadãos, temos que pressioná-los, porque eles simplesmente não estão nos ouvindo.”

A ação, conhecida como Affaire Climat, foi movida pela ONG ambientalista Klimatzaak (“caso do clima”) em 2014, juntamente com dezenas de milhares de cidadãos que assinaram uma petição lançada pela entidade. As audiências orais entraram em seu último dia na sexta-feira (26.mar), o veredicto é esperado antes de meados do ano.

“Este é provavelmente o maior processo judicial da história belga”, diz o embaixador da Klimatzaak David van Reybrouk à DW“O argumento é que as políticas climáticas belgas até agora estão colocando em risco os direitos humanos agora e no futuro.”

A iniciativa exige que até o ano 2030 as autoridades reduzam as emissões de gases do efeito estufa em pelo menos 55% em relação aos níveis de 1990 e denunciam o Estado por falhar em servir e proteger os cidadãos e em cumprir as metas climáticas internacionais anteriores, estabelecidas em 1992.

Litígios climáticos abrem novos caminhos

A Bélgica é o mais recente de uma série de países europeus cujos governos foram levados aos tribunais por organizações ambientais. Em 2019, a Suprema Corte holandesa gerou manchetes globais ao ordenar que o governo do país reduzisse as emissões de gases de efeito estufa em pelo menos 25% em relação aos níveis de 1990 até o fim de 2020, “devido ao risco de mudanças climáticas perigosas que poderiam ter um impacto severo sobre a vida e o bem-estar dos habitantes da Holanda”.

A decisão –em parte baseada no compromisso do Estado de proteger os direitos humanos– veio após uma longa batalha legal travada pela ONG holandesa Urgenda. Veredictos semelhantes foram proclamados na Irlanda em 2019 e na França em 2020.

“Desde 2015, vimos uma aceleração no número desses casos e uma ampliação em sua gama de teorias e alvos”, relata o advogado britânico de direitos humanos Nigel Brook, “vemos isso como uma tendência”. Levar governos aos tribunais não é o método preferido para mudar a política, admite; “É realmente a última opção”.

No entanto, o advogado afirma que o litígio possa forçar resultados tangíveis. “O governo holandês tomou uma série de medidas após a decisão de Urgenda. Ele reduziu os limites de velocidade nas rodovias, mas também acelerou o fechamento de usinas movidas a carvão.”

Diversos analistas observaram de perto uma ação de financiamento coletivo em trâmite no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. Nela, um grupo de jovens de Portugal acusa 33 países ​​de “não terem feito sua parte para evitar a catástrofe climática”.

Sem justiça social, nada de justiça climática

No tribunal de Bruxelas, advogados que representam o Estado belga insistiram que as autoridades levaram a crise climática a sério. Falando pelo governo, a advogada Nathalie van Damme afirmou que “existe uma consciência real”, e “prova disso é o acordo governamental de 2020”.

De fato, ao debater o acordo de coalizão que definiu o curso para o novo governo em setembro de 2020, os partidos belgas dedicaram uma seção inteira a planos para “Um país sustentável”.

Desde a ocasião, a ministra do Meio Ambiente, Zakia Khattabi, dos Verdes da Bélgica, também avançou com um plano de desenvolvimento sustentável que estava suspenso há uma década em meio, a crises governamentais e o caos da coalizão.

Até mesmo David van Reybrouk do Klimatzaak concorda que as autoridades belgas fizeram progressos nos últimos anos, mas insiste que isso “não é suficiente”.

Perto do fim das audiências, Brenda Odimba comentou que aguardaria ansiosamente o veredicto final dos juízes, dentro de alguns meses. Para ela, o caso vai muito além da meta de percentuais ou tecnicalidades legais: “É sempre a mesma coisa: são os pobres que sofrem com as mudanças climáticas.”

A engenheira espera que este caso, como outros antes dele, ajude a estabelecer um vínculo jurídico entre justiça climática, justiça social e direitos dos cidadãos. “Todas essas ações coletivas vão transformar nossos países. Então, finalmente teremos países onde o cidadão se sente protegido, escutado e atendido por seu sistema de Justiça.”

Com informações do Poder360